sábado, agosto 25, 2012

Portugal running e o Urban Trail

Há uns meses atrás, um amigo adicionou-me a um grupo no livro das caras, em inglês Facebook, associado a corridas, essencialmente um grupo de gente que gosta de correr, que corre e que troca ali umas impressões. Até aqui nada de especial. O nome, que dá título a este post, sugeria que aglomerava num só grupo gente que tem uma paixão em comum, e que ali poderia divulgar iniciativas, treinos e esclarecer dúvidas, fosse de que ponto do País fosse.
Pouco tempo depois, reparei que não passava de mais um grupo com boas intenções, mas mal frequentado. Alguns dos membros auto excluíram-se, outros, como eu deixaram de o acompanhar. De quando em vez, numa ou noutra espreitadela, reparava que o dito grupo não passava de um ponto de encontro numa rede social para pouco mais de uma dezena de habitués, que ali combinavam treinos e encontros, jantares e cafés, antes, durante ou após as variadíssimas provas que existem nas imediações de Lisboa. Naturalmente, e atendendo ao desinteresse das publicações, deixei de o consultar.
Vejo agora que aquele grupo de corredores mandou fazer camisolas, personalizadas, atribuindo à pseudo-equipa o mesmo nome que tem o grupo do FB. 
Mas adiante. O objectivo deste post não é fazer uma biografia de um grupo do FB, mas sim de alertar para comportamentos tomados em nome de um grupo, onde qualquer amigo nos adiciona (com boas intenções) e que, tomando a força de um colectivo que não dá opinião, desata a desvirtuar o espírito que normalmente tem quem corre por prazer. Ora eu corro por prazer. Sou pouco competitivo, venho de uma vida sedentária, sou ex-fumador, ex-obeso, gosto muito de usufruir das vantagens deste desporto. Faz-me confusão a inveja, o egoísmo, o chico-espertismo que normalmente não existe na corrida. Já vi finais de provas com dois atletas a acabar de mãos dadas, reconhecendo mutuamente o esforço e sofrimento, já vi grandes campeões a desistir, já vi outros a chorar de alegria apenas e só por acabarem uma prova. Ainda me arrepio quando me lembro de acompanhar a última atleta na Corrida das Festas da Cidade, no Porto, que chorava compulsivamente por ter à vista a meta e assim poder terminar a sua primeira prova de 15 kms. Eu sei o que é aquilo. Reconheço o esforço, já passei por aquilo, e continuo a passar.
Comecei numa prova de 7 kms, já fiz meias maratonas, provas de 10 kms, 5 maratonas de estrada e 5 de montanha. Sempre que posso vou a provas organizadas. 
Embora não sejam precisas para correr, todos nós temos como objectivo terminar provas. São poucos os que não participem numa ou noutra. Por pequena que seja. E daqueles que integram aquele grupo, todos os que opinam por lá, participam em provas. 
Um grupo de atletas, que recentemente caiu no desemprego, e que, corajosamente avançou na criação de uma nova vertente das existentes em Portugal, divulgou naquele grupo uma prova que, com imenso esforço prepararam e promoveram. Como os apoios são poucos em tempo de crise, e os custos de uma prova são muitos, o preço não foi do agrado dos “dinamizadores” do dito grupo. Vai daí, criaram, para o mesmo dia, um evento tipo “Free-Running”. Com cartaz (virtual) inclusive. Seria engraçado criar, em paralelo com todas as provas existentes em Portugal, uma “corrida pirata”, como eles chamam. Dizem que correm “quando quiserem e onde quiserem”. A inteligência deles é tal, que comentam a divulgação da dita prova, com alusão à corrida pirata. Acham giro, divertem-se e fazem da promoção de uma corrida uma palhaçada infantil, digna dos meus tempos de miúdo. Ocupam as ruas, porque sim, com aquele espírito do puto mimado, que não tendo sido escolhido para a melhor equipa na peladinha de jardim, só porque é dono da bola, vai embora e não deixa jogar ninguém.
Esta gente, que se farta de comentar a anulação de provas por causa da crise, que clama por apoios das Câmaras Municipais para que não deixem cair algumas, promove corridas paralelas com um evento divulgado no estrangeiro, por dois ou três carolas do trail. Dois ou três carolas, que há um ano se lembraram de fazer o que ninguém julgava possível. Habituados a treinar em ambientes citadinos para provas que aqueles que agora os boicotam nunca farão, decidiram promover o trail urbano. Aqueles ignorantes desconhecem a quantidade de gente que corre mundo para participar em provas destas, impossíveis de comparar com maratonas, onde se evitam os desníveis, para poderem conhecer as cidades históricas nos seus recantos mais secretos. Há já no Porto uma empresa que se dedica a corridas pela cidade para estrangeiros, a exemplo do que acontece em muitas cidades do Mundo, que recebe turistas indicados por outras empresas similares de destinos como o Japão, Canadá ou Chile. Mas estes inteligentes, que se acham os “Corredores de Portugal”, como se não houvesse mais Portugal para além de Lisboa e da sua ânsia de aglutinação de tudo o que é País, desconhecem os objectivos das provas. Acham que a prova era para lhes sugar dinheiro, e como acham que só eles é que podem correr ali e não têm que pagar, boicotam a iniciativa para se sentirem ainda donos de uma cidade que não é deles, como se acham donos de um nome que também não é deles. 
Começa na próxima semana o Ultra Trail do Mont Blanc. É uma prova que começa  e termina em Chamonix, França, e que passa por Itália e Suiça. É uma prova com mais de 5.000 atletas, sorteados entre mais de 30.000 que se inscrevem e que começou por carolice. Ninguém precisa de pagar para correr no Monte Branco, o dito está ali o ano todo para quem quiser usufruir dele. Mas também não consta que nenhum habitante local boicote a prova. São outras mentalidades.
Espero, a bem do trail, vertente que abracei há pouco mais de um ano, e onde conheci algumas das pessoas mais inspiradoras da corrida, que o Urban Trail tenha muito sucesso. Não ia participar no de Lisboa, mas agora vou. Porque também lá fui o ano passado à Maratona (e vou este ano) porque eventos destes fazem falta ao País.
Aos senhores do grupo do FB intitulado Portugal Running, aconselho-os a terem comportamentos dignos de gente com o mínimo de decência. E o mínimo da decência é não fazerem comentários jocosos a respeito de iniciativas que visam promover, desenvolver e incentivar a corrida.

segunda-feira, agosto 13, 2012

Jogos olímpicos

Terminada a participação nas olimpíadas de Londres, todos correm a esmiuçar as performances dos atletas que integraram a comitiva.
Eu, enquanto mero espectador atento, cinjo-me aos resultados finais. Fracos uns, dentro do esperado outros e espectaculares alguns. Passando por alguns amadores que levam muito a sério a hipótese que lhes dão de justificarem apoios e subsídios decorrentes da participação em Londres, passando por outros que tiveram a infelicidade de um momento, casos do judo e da ginástica, e a terminar naqueles que, tendo como principal actividade aquela que os levou aos jogos, aproveitaram para viver o ambiente da Aldeia olímpica e a sempre única e inigualável participação nas olimpíadas.
Não partilho da opinião da falta de apoios, ou da falta de condições para preparar a participação, nem tão pouco da ideia de que, para haver melhores resultados seria necessário maior investimento. Há imensos países onde o investimento é inferior e o retorno muito superior. O que falta em Portugal é cultura desportiva. Há boa maneira tuga, se não for o Estado a orientar, a suportar ou a pagar, ninguém faz nada. Não é por ter havido multiplicação de piscinas e pavilhões multiusos no País que as modalidades ligadas à natação e aos desportos de pavilhão tiveram desenvolvimento. Foram mais úteis para o fomento da actividade física os parques desportivos e as ecovias, do que os imensos campos de futebol, pavilhões e piscinas construídos, que mais não foram que panaceias para a anunciada crise das construtoras e garantias de reeleição de alguns autarcas. Se gastassem em ecovias o dinheiro que gastam em bandas gástricas, haveria muito provavelmente maior campo de recrutamento para todas as modalidades desportivas. Há 25 anos, quando as condições eram menores, havia mais empenho numa participação olímpica do que agora. Há mais mediatismo noutros eventos, e há mais eventos.
Voltando aos resultados, ninguém pode avaliar um atleta por uma participação num grande evento internacional, mas parece-me que, nem todos apontaram para os Jogos o topo de forma, pelo menos no atletismo, o que, nalguns casos se compreende. Os que participaram nos jogos fizeram por merecer a chamada. Não esperava mais do que o máximo de dedicação em treino nestes quatro anos. O resultado é o que menos importa. Temos uma representação pequena, porque pequena é a base de recrutamento.
Voltemos agora ao normal. Os atletas fazem pela vida sem apoios e quase sozinhos e são ignorados pelo País futeboleiro.
Quem gosta de desporto em geral, como eu, que faça o mesmo ao futebol, apreciem apenas os grandes eventos. Campeonato do Mundo ou Europa, o resto é para ignorar. E façam desporto, pela vossa saúde!

sexta-feira, agosto 10, 2012

Sou tripeiro. Sou do Porto!

 

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O texto não é meu, mas é exactamente aquilo que eu penso desta cidade. Moro em Gaia, e sempre que passo a ponte D. Luís sinto um arrepio de quem, mais uma vez regressa a casa. Aquele "quadro", a cascata são joanina que tão bem descreveu Carlos Tê no Porto sentido cantado por Rui Veloso, é uma brisa que me refresca a alma e aquece o coração. Também eu sou do Porto, também eu o sinto meu. 

 

Nasci na freguesia de Santo Ildefonso. Os meus dois primeiros anos, passei-os em Cedofeita. Cresci, vivi e vivo em Ramalde. Sou do Porto, portuense, tripeiro.

Ninguém escolhe a cidade onde nasce. Eu nasci no Porto. Ligam-me a esta cidade sentimentos que por mais nenhuma poderei ter: uma ternura, uma nostalgia, um afecto, que só se tem pelo sítio onde se nasce e onde se cresce. Foi no Porto onde aprendi a andar. Foi nas escolas do Porto onde aprendi a ler, a estudar… Foi no Porto que criei os meus primeiros amigos, que fiz os meus amores. A minha infância (e a felicidade que dela emana) tem o Porto como pano de fundo.

Gosto do sotaque do Porto, das vogais abertas, da força do discurso, dos palavrões… Gosto das ruelas da Ribeira, da sua nobreza e burguesia entranhadas. Gosto das pontes. Gosto da Foz do Douro, do mar… Gosto das vistas da Sé e da Praça da Liberdade. Gosto da comida, das francesinhas, das tripas e da hospitalidade. Gosto do São João (a noite sem fim) onde a cidade se torna pequena e o que na Baixa começa na Foz termina.

Não sei se o Porto é a melhor cidade do mundo, nem me interessa. O Porto é a minha cidade. Por isso me comovo com o “Porto Sentido”, por isso vibro com os golos que desfraldam as bandeiras com o nome da minha cidade (nunca entendi os tripeiros que só vibram com o desfraldar de bandeiras doutras cidades e doutras freguesias…).

Ao Norte de um país do Sul da Europa é uma mistura, mais Celta que Moura, nas gentes, nas casas, nas ruas, nas cores e na chuva. Cidade histórica, invicta, nobre e burguesa, é também uma cidade pequena, fechada e conservadora. Não sou obrigado a gostar de tudo no Porto, mas não renego o sítio onde nasci e cresci. Sou do Porto por emoção e por razão!

Vivemos num país que durante muito tempo afunilou o desenvolvimento num só local (a capital) deixando tudo resto ao abandono. Esse é um facto do passado. Hoje o Estado já não tem o poder que teve e está muito mais nas mãos de cada cidade projectar-se competitivamente ao nível internacional. O Porto de hoje precisa de mais economia, de mais riqueza e energia, criatividade e sabedoria (por isso é tão importante potenciar ao máximo a Universidade). Precisa de redes, parcerias (como a aproximação à Galiza) e infra-estruturas (note-se a importância do metro e, principalmente, do moderno aeroporto, para o desenvolvimento turístico e económico da região). Porém, para tudo isso, precisa de gente e muitos tenho visto a emigrar (para Lisboa primeiro, para Madrid, Londres, Bruxelas ou Luanda depois). Resta saber se vão voltar (eu acho que muitos querem voltar)... Eu próprio não sei em que cidade terei que ficar… Sei é que esta é uma boa cidade para se amar e que, qualquer que seja o futuro que o futuro lhe reserve, esta é a cidade de que sempre me irei lembrar!

Gabriel Leite Mota, in Jornal Público, P3, 07/08/2012

segunda-feira, agosto 06, 2012

Ultra Trail Nocturno Lagoa de Óbidos

Nada melhor que uma estreia para a minha 10ª maratona.
Uma estreia em prova exclusivamente nocturna, e uma estreia num terreno que até aqui evitava: Areia e dunas.

A prova começa (apenas o controlo de chip) e termina no Castelo de Óbidos, daquela belíssima localidade do centro do País. Com a realização da Feira Medieval, e a inevitável presença de milhares de visitantes, foi assim emoldurada a partida simbólica, com o serpentear das ruas da Vila histórica por umas centenas de atletas rumo aos trilhos que circundam a bela lagoa de Óbidos. A partida real foi dada no exterior da muralha, com o rápido alongamento do pelotão, onde a boa disposição imperava. Entre os imensos participantes, muitos eram os que se estreavam em provas de trail, ouvindo-se bastantes e constantes avisos de “pedra”, “ramo” ou “subida”. Apesar de todos irem equipados com o obrigatório frontal, as armadilhas espreitavam sempre junto aos pés. Estando as marcações, excelentes, mais acima, era obrigatório projectar para aí a luz. Qualquer desatenção levava a desvios evitáveis e que aconteceram amiúde.

Até à separação das provas, a curta de 25 km e a distância ultra de 50, o trilho foi pequeno para tantos participantes. Junto à lagoa, nas zonas de passagem por água ou lama, já era difícil a progressão. O serpenteado de luzes embelezava a noite da pacata planície e os gritos de alegria de corredores maravilhados com a experiência rasgavam o silêncio habitual da zona. Os campistas, admiravam o cortejo, e ofereciam o que podiam “uma água ou cerveja”, disponibilizava um miúdo. Decidi recusar a cerveja.

Depois de separadas as provas, a calma. Aquilo que mais aprecio nas ultras. Parece que todos vamos para ali em busca de retiro espiritual. A paz que sentimos enquanto sozinhos na natureza, em perfeita harmonia com o meio ambiente, um coelho que passa, uma coruja que canta ou um sapo que coaxa, é inexplicável e inigualável. De noite a calma é exponencial.

Aos 26 kms, depois do 2º abastecimento, a grande dificuldade desta prova. Chegados à Foz do Arelho, 6 kms em areia e arribas. Para subir as arribas, em terreno de areia muito fina, por cada passo que dávamos, parecíamos deslizar 3 ou 4. Impressionante. Um troço que incluí passagens por rochas com menos de 0,5 mt de largura, e sempre com muita areia. Palavrões geravam incentivos, das fraquezas redobravam as forças e lá fomos, num grupo que entretanto se formara, até ao abastecimento do quilómetro 32.

Daqui até ao último abastecimento fui travando conhecimento com os dois atletas que haviam saído comigo do controlo dos 32, e que comigo se perderam por umas centenas de metros. Nada de grave. Lá fomos correndo nas descidas e nas zonas planas e caminhando nas subidas, visto que, apesar de termos saído da praia, o terreno continuava muito solto e em areia. A chuva, miudinha, já nos acompanhava para nos refrescar. Fomos passando vários corredores até ao final, acabámos frescos e com sentimento de dever cumprido.

As peripécias vividas foram muitas, mas abstenho-me de as contar, na certeza de que, os que as viveram sabem do que falo, e os outros devem vir experimentar. Importante dizer que a prova é superiormente organizada, num ambiente de corredores para corredores. A espectacularidade do trajecto, embora sem podermos desfrutar em pleno, por ser de noite, mas que tem uma beleza sem igual pelo efeito provocado pelo pelotão e pela zona de praia, levam-me a dizer apenas e só que fiquei apaixonado por esta corrida. No próximo ano, se nada houver em contrário, não faltarei.

Os abastecimentos, com um apoio inexcedível dos voluntários, com presença de socorristas e muito bem colocados ao longo do percurso. Percurso bem marcado, a exigir alguma atenção nas zonas mais iluminadas, onde os reflectores não eram perceptíveis (km 26 e 32), talvez fosse prudente acrescentar algumas fitas reflectoras nesses locais e em alguns cruzamentos.

Uma última palavra, de agradecimento para o Jorge Serrazina e restantes membros da organização, que tão bem nos acolheram e tão bem nos trataram nesta fantástica festa do trail nacional. Obrigado!

Os resultados e outras informações da prova, podem ser consultados aqui.