segunda-feira, março 10, 2014

5º Dia do Caminho - Celebração

Ao chegar à Praça do Obradoiro, em frente à Catedral de Santiago de Compostela, depois de contados os quilómetros desde a "Milladoiro", que parecem ter mais que os 5 anunciados, todos se emocionaram. Não tanto pelo momento do fim deste Caminho, que como disse há um ano (e mantenho), ali chegados sabemos que não é o fim, mas pela sensação de fim que nos abraça. Pelo sentimento de término de algo que, dos 8 estreantes, apenas 1 ou 2 tinham a certeza de conseguir concretizar. Eu sabia que todos (salvo qualquer lesão) o conseguiriam. Sabia porque não admitiria outro fim. 


Hoje descobri o fim do Caminho. 
Descobri que há um fim quando temos dúvidas. Descobri que há um fim em tudo. Descobri que a miséria tem fim, que a dúvida tem fim, que a alegria tem fim, que a solidão tem fim... Tudo, mas tudo tem um fim. Faz sentido que este Caminho tenha fim. 
Quando há alguns meses lançamos o desafio de ir a correr do Porto a Santiago, depois de sabermos os integrantes do grupo, sabia que o nosso objectivo seria o de cada um deles. 
O Rui Martins nunca tinha corrido mais que 1/2 maratona. O Mário desejava fazer o Caminho, é maratonista, mas não havia corrido tanto, muito menos em dias consecutivos. O Renato, recente Iron Man, desconfiava da capacidade do corpo em aguentar dias consecutivos de esforço. A Paula. A Paula, que tanto gosta de correr, que é de uma alegria contagiante, nunca tinha retirado o verdadeiro prazer da corrida sem competição, com ela ou adversárias, até há pouco mais de um mês fazer um treino de 6h de trail connosco. Nem imaginava ser possível correr até Santiago. Mas acreditou. 
E a Ângela? Que dizer de uma pessoa que já andou a correr pelo Sahara (1/2 maratona, é certo) e que, quase sem saber o que era uma prova de estrada, se dispõe a desafiar-se e enfrentar tal desiderato?  
A Patrícia, que pouco corre, tinha a mesma ideia de tentar o impossível. Apesar de pouco treinar, lá se aplicou a mudar hábitos para poder encarar os dias seguidos a correr. 
O João Casal, que no próximo Verão vai dar a volta a Portugal em 53 etapas de 50 km por causas solidárias, veio para o Caminho para aprender, dizia, "a correr devagar". 
E o por fim a Susana. A Susana, ultra maratonista, depois de 3 ultras nos primeiros 2 meses do ano, a última das quais uma semana antes do Caminho, quando confrontada com a vaga disponibilizada por uma lesão de um dos atletas inscritos, perguntou-me: "Achas-me capaz?", "Claro que sim", afirmei, "se há alguém que é capaz de, sem prever, concluir tal desafio sem estar a contar sequer fazê-lo, és tu". 
Estes 8 bravos começaram este Caminho, quando depositaram na nossa equipa a confiança de tudo assegurarmos para que fossem capazes de o concluir, a começar por sermos os primeiros a acreditar que o fariam com sucesso. 
Hoje foi o dia em que acabaram este Caminho e em que nós concretizamos o seu fim.
A partir de hoje, todos eles têm a certeza que conseguem superar os seus próprios medos e limites, que se podem aventurar em Maratonas ou Ultra maratonas, 100 km ou 100 Milhas, que podem dar passos maiores dos que os que julgavam capazes, de abrandar ou acelerar, de se superarem sempre. 
Hoje descobri um fim no caminho. 
Talvez um dia descubra o meu "Eu interior", que de tão procurado mais parece o Santo Graal. Talvez descubra mais coisas no Caminho, como tantas outras que já descobri. 
Uma certeza tenho, que o Caminho nos faz melhores, mais fortes, torna-nos infinitos, dando-nos a sensação que temos ali um refúgio de encontro com tudo aquilo que julgamos não ter. 
Há um ano atrás quando terminei o Caminho, tive a certeza que voltaria. Tenho a certeza que todos os que lá estávamos hoje pensaram o mesmo. 
Ainda não foi desta vez que vi alguém triste ou resignado no "Caminho". Não me parece que vá ver nunca. É impossível. O Caminho é um encontro com a felicidade. 
Amanhã escrevo a crónica final, a quatro mãos, como prometido. Acho que hoje é importante realçar a celebração da alegria de, 250 km depois,  ao fim de 5 dias, celebramos em grupo a chegada a Santiago. 
Todos chegaram a este fim. Mas atribuam-lhe outro fim que não o final. 
Ultreya!  

3 comentários:

  1. Siempre es especial llegar a Santiago. Felicidades!

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  2. É tão bom chegar ao fim da estrada e saborear um enorme paz interior antes de nova estrada nos seduzir com seus encantos!

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  3. Sensacional, amigo. Meu carinho e admiração.

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