segunda-feira, fevereiro 02, 2015

Trilhos dos Abutres 2015

Abutres 2 Rui 2.
Tenho uma contabilidade estranha com esta prova. Quinta edição, quarta participação, e segunda derrota por KO. Claro que é impossível ir a esta prova e não levar porrada "forte e feio", bem como é impossível chegar ao fim seco e limpo, mas partimos sempre com a esperança (e arrogância) dos experimentados, dos que acham que, com calma a coisa se faz.
Devia ter feito com os Abutres, o que os Abutres fizeram comigo, mantínhamos uma relação à distância, cordial, mas sem lhe dar (à prova) oportunidade de tanta pancada. É que ir à Serra da Lousã, jantar uma tábua de queijos e chouriço assado, regado com " Papa Figos", enquanto se participa numa agradável - mas pouco participada - tertúlia, e ir de seguida passar a noite num belíssimo quarto temático, é caso para paixão; levar porrada a seguir já soa a violência doméstica.
E escusam de me justificar aquelas imersões na lama com a piada já repetida do SPA, aquilo não tem piada nenhuma. E granizo? GRANIZO?!?! E neve?!? Neve é bonito, mas não completamente ensopado, sem luvas (e a ter que as aquecer nas partes íntimas, que obviamente recolhiam de imediato) e completamente a bater o dente. E os veados? Veados em bando (eram muitos e não é manada que se diz) doidos por verem tantos doidos debaixo de trovões...
Lindo! A Lousã é linda. Os Abutres partem-nos todos, mas é toda aquela envolvência que nos atrai. Tal como muitas vítimas de violência voltamos sempre para nos afirmarmos, ou apenas para desfrutarmos do que nos apaixona naquela Serra e nesta prova em particular. É isso que nos faz voltar.
É apaixonante ver, 4 anos depois, cada vez mais estreantes, seja na distância ou no género, a ficarem a odiar ou adorar o Trail. Porque cartaz de Trail é o que esta Serra nos dá, (o Moutinho chama-lhe Serra de "petróleo verde" tal é a abundância de opções para fazer aqui provas da especialidade), e que os Abutres (a Associação) tão bem dinamizam e preservam. É obra.
Depois de tanta lama, tanto tombo e tanta água, depois de ter as mãos quase como um ouriço (tantos são os picos) acho que fiquei como aqueles traumatizados com Síndrome de Estocolmo - ainda mais apaixonado por tudo aquilo e com muita vontade de repetir. Esta é a prova de "abertura". É a prova de iniciação às ultras de média distância, de iniciação ao Trail a sério (na vertente mais curta), é Trail do melhor que se faz em Portugal.
Quanto às vicissitudes da prova, e à minha prestação, limitaram-se a 32 km. Fiquei, como mais de 40% dos que a iniciaram, no fatídico km 31, que era supostamente o 29, e cujo tempo limite era de 5h30, ao fim de 5h40 a lutar contra a lama e o frio. Diga-se em abono da verdade, que, se não fosse barrado teria batido em alguém. Já conheço bem o que faltava, e prefiro lá voltar num fim-de-semana com menos trânsito nos trilhos, com menos lama e com melhores condições. É este o espírito com que, cada vez mais encaro o trail, e que o trail deve ser encarado (excepto para os que lutam pelos lugares cimeiros da classificação).

Estou convencido que a organização tirará desta edição mais uma lição para o futuro. Talvez seja o tema de uma próxima tertúlia, moderada (e bem) de novo pelo José Guimarães, e onde todos, atletas e organizações, possamos discutir formas de tornear estas surpresas da natureza. O Trail está a evoluir no nosso País, e já é tempo de também neste aspecto, podermos ter alternativas viáveis para minimizar as desilusões.
Foi um excelente fim-de-semana de propaganda do desporto que tanto gostamos. No próximo ano crescerá a prova, seguramente na exacta proporção dos desgostosos de ontem.
Parabéns à Associação Abutrica. Fazer provas de Trail não é fácil (se fosse faziam-se excursões) e quando se tomam decisões, corre-se sempre o risco de haver julgamentos mais ou menos justos. Havemos de discutir isto abertamente, como temos feito nessas tertúlias que estranhamente são tão pouco participadas - corredor de Trail acha sempre que já sabe tudo, mas aprendemos sempre em todas as vezes que saímos para a natureza; daí dar razão ao Moutinho quando diz que, "o importante quando se faz Trail, é ter mente aberta". Não podemos dar nada como garantido, devemos respeitar sempre a natureza, a nossa e a envolvente, com a humildade de quem é sempre mais fraco que os elementos.
É isto a Lousã: Quanto mais me bate, mais eu gosto dela. 
Até aos Trilhos de 2016!

15 comentários:

  1. Ora cá está, através de mais este teu texto, a razão porque gosto tanto de vir a este cantinho ler o que escreves - além da tua escrita, gosto imenso do espirito com que encaras este nosso desporto, e identifico-me com ele (nem sempre concordando com todas as opiniões como é normal). Parabéns grande Rui....admiro e respeito imenso todos os que no sábado se enfiaram pelos trilhos da Lousã naquelas condições ainda mais difíceis do que o habitual - pode parecer sádico, mas adorava ter estado presente nesta edição para ver até onde as minhas pernas e mente me levariam.
    Aquele abraço e até um dia destes algures por um trilho ou numa estrada qualquer

    P.S. Para o ano desempatas isso...falta saber quem marca primeiro o 3 ;)

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  2. Parabéns pela participação, amigo.

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  3. Chouriço assado, queijo e tinto. Quarto do carpinteiro. Lousã. Tudo contigo. Que rico fds. :)

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  4. Excelente texto Rui
    Não sou capaz de desafiar a montanha nem o mar eles quando querem engolem nos.
    Abraço Amigo

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    1. Abraço, Luis!
      Para o ano dobras o "Cabo das Tormentas" ;)

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  5. Rui, belo texto como sempre são os que escreves. Quanto ao desafio com os Abutres estou um pouco melhor que tu. Ainda estou ao nível da cabazada 4 a 1.

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    1. És uma máquina.
      Distraíste-te com a beleza daquela força intensa, senão estaria 5-0.

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  6. Não tenho duvidas os Trail é tudo isso!
    Um abraço.

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  7. Ainda foste até aos 32 Km eu fiquei pelos 25 Km, já estava "regelado", já não sentia as mãos e mais qualquer coisa...
    Dizes que para o ano lá estarás para o desempate do 2 a 2, pois eu estarei para o desempate do 1 a 1, vamos ver para que lado caímos além dos tombos ;)

    Abraço

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    1. Estou convencido que foi um acontecimento extraordinário. No próximo ano ganhamos nós.
      Abraço!

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  8. Divertida forma de falar das tormentas ali passadas por vales e serras, e rios de água e de lama, em 5 também já fiquei em duas pelo caminho, e o que é estranho também não guardo rancor pelo ocorrido, quando aplicamos o que podemos dar e os elementos naturais não o permitem fica sempre aquela sensação do dever de superação adiado, é uma coisa que não tem retorno porque quando voltamos já nada está igual, já nada ou quase nada existe para comparar, é sempre um novo desafio e o próximo tal como o meu amigo é para superar, de verdade

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