segunda-feira, janeiro 30, 2012

II Edição dos Trilhos dos Abutres

Empeno Abutrico.

O subtítulo serve como definição perfeita para o estado do meu corpo no “day after” à prova que decorreu ontem, nos belíssimos trilhos que circundam Miranda do Corvo e a Lousã, com base no ninho da Associação que organiza o evento, sita na primeira destas localidades.

 

Fomos brindados pela Natureza com um dia belíssimo, embora frio, para percorrermos aqueles 45 km de subidas e descidas. A esfregar as mãos e a bater o dente, fomos chegando ao Pavilhão Municipal de Miranda do Corvo, onde decorriam as verificações de material obrigatório para os participantes da Ultra. No centro do ringue o ambicionado alvo para todos os que partiam, o insuflável pórtico com a inscrição que todos queremos ver: META.

A partida foi dada depois de um aquecimento sui generis ao som de uma gaita de foles e bombos que encorajou os que ainda se resguardavam do frio.

Não tenho a mínima noção do desenrolar da prova para vos poder descrever as vicissitudes que levaram às classificações finais. Posso no entanto testemunhar, enquanto finalizador, a imensa alegria que nos invade quando regressamos ao Pavilhão. Aquela última subida, já dentro da Vila…

Fiz o primeiro terço da prova sempre na espectativa de começar a descer. Está bem. Os abutres acharam que descer não se desce no início e só nos deram pouco mais de 2 km de descida nos primeiros 20, com muita subida e mais lama ainda! Até aí, no máximo da altitude que atingimos (935 mts), acompanhei o passo do João Meixedo (ou ele o meu), junto com o Luis Rodrigues, também dos Porto Runners e de um companheiro de jornada que conhecemos na Serra, o Bruno Domingos, homem do BTT e que se estreava, como nós, numa ultra de montanha. Na subida para o alto da Serra o Meixedo “meteu” a tracção às 4 e lá foi ele no seu passo rumo a uma brilhante participação. Ainda o vi, depois de passar a íngreme descida do “Revoltado” (nome atribuído por mim a um corta-fogo com uma inclinação tal que parecia o tecto de Miranda do Corvo, onde um atleta reclamava e dizia que aquilo era de loucos e que só saía dali de helicóptero) mas não consegui ir tão rápido quanto ele. Juntámo-nos, eu e o Bruno, com a Carla Monteiro, que vinha desde a partida com o Fran, e nos tinham alcançado no 1º abastecimento.

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Seguimos monte abaixo, (com 1 km em que subimos mais de 130 mts e me fartei de praguejar), e que culminou com uma descida de uma pista de Downhill com inclinações superiores a 30%, e onde as quedas, sem gravidade, foram uma constante. Foi uma desagradável incursão ao “sku”, vulgo desporto de quem não se consegue manter em pé, e que durou praticamente até ao km 28, onde estava o segundo abastecimento. Sabíamos que ainda vinha muita subida, embora tivéssemos já um assinalável desnível positivo acumulado, sendo essencial e muito importante um rápido restabelecimento das forças. Comemos uma sande de presunto e um creme de cenoura, enchemos os reservatórios de isotónico, e lá fomos nós para o trilho. Até aos 33 km, num trilho muito técnico, junto a belíssimas quedas de água, fartei-me de insultar a geografia do terreno, na esperança que o calão e os impropérios servissem de alavanca em cada obstáculo que tinha de transpor. Subimos 5 km em pouco mais de 1h30, e demorámos 2 horas para completar os restantes 12 km até à meta, num trilho muito bonito e extremamente técnico, semelhante à parte inicial da prova, onde abundavam as passagens por pontes de madeira e troncos de árvores sobre o rio, onde nós optávamos por refrescar os pés e limpar a lama das sapatilhas. Os últimos 5 km, já depois do abastecimento foram em corrida, ligeira que já não havia forças, para tentar chegar o mais rápido possível ao fim.

Depois de uma paragem técnica para retirar duas pedras da sapatilha, lá fomos nós em busca da meta. 9 horas depois de sair daquele Pavilhão, no crepúsculo do dia, algures no meio da Vila de Miranda, oiço umas vozes ao alto a gritarem “força, são só mais 100 metros”; olho e vejo uma parede verde com um carreiro ao meio desenhado por passadas firmes dos mais de 300 atletas que por ali tinham escalado o último obstáculo, rumo à glória de terminar aquele fabulosos desafio. Ao olhar para aquele autêntico muro, confesso que me foi impossível conter o insulto, que verbalizei para os meus pés, transformando nas últimas forças o último nome que chamei àquele último trilho abutrico.

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Foi a minha primeira Ultra, numa prova que recomendo.

Agradeço a paciência da Carla Monteiro, do Francisco Serrano Cantalejo (Fran) e do Bruno, que me aturaram, e que esperaram por mim quando eu pensava que ia fracassar. É formidável como o corpo humano aguenta tanto antes de quebrar, e como a nossa cabeça faz tanta diferença num momento de fraqueza.

A corrida transformou a minha vida, mas não é mais do que um estado de alma que tão bem nos faz ao corpo. Há quem diga que começamos a morrer quando deixamos de ser crianças, e nós, os que corremos por prazer, encontrámos na corrida a forma perfeita de, enquanto adultos, fazermos uma série de traquinices e maluqueiras que de outra forma não faríamos, e que ninguém nos leva a mal. Mesmo desafiando os nossos limites, num plano de quase inconsciência juvenil, temos a recompensa única de terminar desafios que, ainda há pouco tempo julgávamos impossíveis. É essa a única diferença em relação à infância, a consciência dos desafios. Mas sem desafios, a vida perde sal.

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Resta-me agradecer aos meus companheiros de equipa dos Porto Runners, em especial aos companheiros de jornada Joana Leite e Miguel Santos, dois campeões numa estreia em grande nível; e ainda a todos os envolvidos na organização deste magnífico evento. Todos foram inexcedíveis, sempre com palavras de incentivo e exemplares na colaboração com os atletas.

Parabéns aos Abutres!

Vemo-nos na 3ª Edição!

segunda-feira, janeiro 09, 2012

Correr com Prazer na Serra da Cuca Macuca

No passado Sábado, com excelente organização da equipa do Correr por Prazer, site que serve como muleta do imenso pelotão de amadores que têm como hobbie este desporto cada vez mais popular, decorreu  nas Serras de Pias e Valongo, um Free Running de Trail.
A empreitada foi apimentada pela participação do alpinista João Garcia, que acedeu ao convite do Vítor Dias, grande dinamizador do evento, que, à imagem do seu projecto cibernético, se revela um exímio promotor destas iniciativas.

Foi agradável ver toda a colaboração do Grupo Dramático e Recreativo da Retorta, que disponibilizou as instalações (balneários e sala de convívio) para servirem de base ao evento, bem como o apoio de uma carrinha para a eventualidade de haver quem fraquejasse ou se lesionasse.

O treino decorreu num agradável ambiente de sã convivência, onde os mais experientes se prontificaram a transmitir as dicas necessárias para melhor nos adaptarmos às condições do trail. Mais de 150 almas serpentearam as subidas e descidas das bonitas serras de Pias e Sta.Justa, durante cerca de três horas, com passagem pela Aldeia de Couce com uma envolvente que nos cativa e prende, num desejo de prolongamento de toda uma ruralidade cada vez mais rara no Grande Porto, e que, por ali, ainda perdura. Só os risos e graçolas dos participantes, e uma ou outra moto, incomodou o sossego de um banal Sábado para as gentes que habitam a Aldeia, e para a fauna e flora que a rodeia. O vento esse, soprava moderado para arrefecer os “motores” que aqueceram com o esforço de empurrar o corpo serra acima e segurá-lo encosta a baixo. Mas não houve frio ou cansaço que esmorecesse a alegria e boa disposição de todos num treino que, para muitos, foi o primeiro de muitos na corrida pela natureza. É uma forma de nos sentirmos parte de um Mundo onde tudo tem o seu lugar, numa harmonia perfeita entre o Homem e a sua envolvente, ao contrário da estrada, onde muitas vezes nos sentimos corpos estranhos a serpentear, ora por pessoas que vagueiam num vai-e-vem de vidas desenfreadas, ora por entre máquinas que todos querem que os levem a todo o lado. Na corrida na natureza, somos nós e o Mundo tal como o nosso corpo o conhece, e de repente, tudo faz sentido. Faz sentido o desafio constante do João Garcia com os cumes mais altos deste planeta e faz sentido que ele nos queira transmitir a fantástica harmonia do Homem com o seu meio ambiente, de nos mostrar que, apesar de todas as agressões que fazemos ao Mundo, ele ainda é nosso aliado nesta luta de sobrevivência que ele tão bem personifica. É, ele é um sobrevivente, um lutador e um brilhante comunicador. E nada melhor que uma serra para tal.

Depois de percorrermos os trilhos escolhidos pelo staff do Correr Por Prazer, dedicamo-nos a outros prazeres, que as máquinas são de carne e osso e precisam de abastecimento. Juntando o que os que puderam ficar trouxeram, deu um repasto digno de mesa Real, acompanhado ao acordeão pelo Luís Pires, homem que se revela um excelente animador de eventos em família, como foi este da família que é o pelotão amador.

As imagens do evento ilustram bem o que eu aqui tentei descrever. Podem consultar as excelentes reportagens fotográficas do Luis Rodrigues e da Lina Batista, aqui.

Obrigado Vítor Dias pelo teu esforço, pelo teu trabalho, pela carolice que aplicas em tudo o que nos dás.

A melhor forma que tenho de te retribuir é com a única imagem que me veio à cabeça, quando, antes de partirmos rumo à Serra, fizeste alusão aos 50 kgs que eu já perdi desde que comecei a correr. Por Prazer.

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