sexta-feira, maio 04, 2012

Ainda o Pingo Doce

Não sou economista, director de jornal, deputado à AR, nem cronista ou comentador da actualidade política. Ao contrário da grande maioria dos "opinion makers" deste País, vivo no Porto.
Viver fora de Lisboa e da sua sufocante área metropolitana, dá àqueles uma visão deturpada da realidade que se vive no País. Consideram, para tirar ilações e sensibilidades sobre qualquer assunto, que aquilo que vêm é o espelho do País. Quando muito, e se as tv's tiverem estagiários disponíveis para relatos tremidos, apercebem-se da realidade do Porto.
Tenho seguido com especial atenção o debate gerado em torno da promoção de 1 de Maio no Pingo Doce. Quase todos se escandalizaram, com a esquerda e sindicatos, que se acham donos de datas, a liderar a indignação. O governo, na linha socialista de todos os que nos governaram desde 74, tenta legislar margens de lucro. Os pudicos e pudicas da esquerda caviar, falam do perigo de ajuntamentos de povo (que horror) e da exploração dos funcionários do Pingo Doce, que, como é hábito da esquerda, queriam que fossem obrigados a descansar. É pecado trabalhar no 1 de Maio.
Ora, não sendo eu aquilo tudo, não deixo de ser cidadão e observador do fenómeno.
No dia 1 de Maio não fui ao PD. E não fui porque abomino lojas e centros comerciais em dias festivos. Mas também evito praias em Agosto, jogos de futebol, trânsito em hora de ponta, etc. Não gosto de confusão.
Ontem fui ao PD do costume, o de Canidelo, junto à praia, em Gaia. É o sítio onde faço compras, quase semanalmente, por ser o mais próximo de casa. Curioso, com uma imagem formatada pela opinião bebida na comunicação social, e apenas com um ou outro testemunho na primeira pessoa de alguns clientes, (quem teve paciência e tem que contar todos os cêntimos, ganhou) quis saber mais sobre a empresa e em especial sobre aquele dia. Aproveitando o facto de estar na hora do fecho e ser o último cliente, fiquei um pouco à conversa com uma funcionária (coisa que poucos se devem ter preocupado em fazer). Disse-me que recebem todos os feriados a triplicar e têm direito a uma folga extra, preferindo assim, quase todos trabalhar (liberdade também é isto, poder escolher), os Domingos recebem a dobrar, e quando têm que fazer horas nocturnas recebem como tal. Disse-me ainda que a grande confusão no dia da promoção, foi o facto de não haver estacionamento para tanta gente, nem espaço dentro da loja. Os stocks esgotaram (como seria de esperar), as filas para as caixas eram intermináveis (quase todos os clientes faziam compras enquanto um esperava na fila), e o dia começou mais cedo para preparar tudo aquilo e terminou mais tarde. Não tiveram oportunidade de fazer as compras com a promoção nesse dia, tendo sido informados que o podem fazer agora, depois de repostos os stocks. Diz-se contente por trabalhar no grupo Jerónimo Martins e gostar do que faz. Aprecia o facto de ser acarinhada, sente que faz parte de um todo, por ser respeitada, por receber prémio dos lucros da empresa e por poder fazer o que gosta. Não, não era a gerente de loja. Falei com uma Senhora, nos seus 50 anos, funcionária da peixaria.
Não foi por isto que lutaram os que morreram nas lutas sindicais do século XIX em Chicago?
Eu sei que é uma chatice apregoar o socialismo e vir um grupo empresarial da grande distribuição aplicá-lo com mais eficácia que os próprios. Deve doer. Daí terem começado a chamar a Soares dos Santos, merceeiro holandês.
Deve ser por não ter invocado a crise para cortar direitos aos trabalhadores, ou por ter-se atrevido a liderar um grupo que gera lucros e os distribui com equidade.
Deram-lhe razão, à posteriori, pelos insultos dogmáticos de quem se sentiu ofendido pela violação do dia sagrado sindical. Se calhar seria bom ouvirem quem trabalha.

9 comentários:

  1. Um texto bem estruturado com algumas opiniões que coincidem com as minhas e outras que nem por isso ... só estragaste tudo na parte final quando afirmaste que aquilo que a jerónimo martins colocou em prática se chama socialismo. A menos que tenha sido uma provocação deliberada, e então aí sim, estiveste bem.
    Aquele abraço.

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    1. Claro que foi provocação. Mais aos que se intitulam socialistas de dia e põem o avental à noite.

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  2. O nome que cada um adopta para si nada me diz. Da mesma forma que o PS nada tem de socialista também o PSD nada tem de social democrático, e quanto ao centrismo do CDS estamos conversados. Sofreram todos um shift à direita ...

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  3. (o coment é meu: Meixedo)

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  4. Verdade, verdade. Mas querem controlar tudo, que é um tique pouco de direita. Abraço.

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  5. A minha conclusão é mesmo essa também. Sem "ismos" sem "tabus", vivem do lucro e partilham com quem trabalha mais do que qualquer defensor de "ismos" de qualquer facção... Não são anti-ismos nem quiseram atacar "ismos". Felizmente trabalho numa empresa muito parecida (mas já foi mais...).

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    1. É verdade Sérgio. Fossem todos assim, o capitalismo era perfeito. Mas seria importante que os empregados também compreendessem quando não é possível repartir. E essa é também uma das dificuldades do capitalismo.

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  6. Em tempos de vacas magras a vaca é de todos, mas quando ela voltar a engordar nem lhe tocas nas tetas!

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