Confesso que estou farto deste país. Desde que sou gente que sempre ouvi tudo e todos a queixarem-se de tudo, da vida, da falta de trabalho condigno, da crise, do dinheiro que é pouco, dos preços que são altos, etc. Quem dos que nasceram e cresceram nas décadas de 60, 70 e 80, não se lembra dos avós falarem dos preços baixos de tudo e mais alguma coisa, no tempo deles?
Esta geração nascida já em tempos europeus, que agora se diz à rasca, não deixa de ter razões para protestar, mas, os do meu tempo, não tinham nem carro para andar por aí à conta dos papás, nem net paga pelos papás. Não havia meios de protesto para além do voto, dos comícios, das manifestações ou da simples tertúlia à mesa de cafés rodeados de uns finos.
A minha geração lutou contra a falta de condições financeiras dos nossos pais para nos pagarem a faculdade. Lutamos por direitos que foram tomados como adquiridos pelas novas gerações e entretanto gastos pelas gerações mais velhas. Somos os que nos maravilhamos com a Europa e que perdemos a ilusão na mesma. Subimos ao Éden e rapidamente caímos na real.
Brincamos nas ruas das nossas terras, sem wireless ou redes móveis. A polícia conseguia assustar-nos e impunha respeito. Se fossemos apanhados pela justiça íamos parar à tutoria. As nossas loucuras passavam por campismo selvagem e um festival de música não passava de umas festas de garagem, ou de uns concertos nuns pavilhões desportivos.
O preço do petróleo não era discutido todos os dias, já que, os poucos que tinham carro, não o usavam todos os dias. Íamos a pé para a escola. Não havia sms, nem mms, nem e-mails. Mesmo assim, os velhos não apodreciam sozinhos em casa. Os partidos pequenos, tipo BE, não tinham audiência de milhões através das Tv’s, tinham que cativar audiência para os comícios, senão esfumavam-se.
Os políticos temiam o povo. Tudo era espontâneo.
Fazíamos RGA’s (Reunião geral de alunos) nas escolas. Havia conselhos de turma, em que os delegados estavam presentes, para castigar eventuais abusos de algum aluno. Agora nem sei, mas devem ter pedo-psiquiatras, pedagogos, sociólogos e psicólogos.
A malta andava sempre à rasca. Dinheiro só nas férias. Trabalhávamos. Havia OTL (Ocupação de tempos livres), empregos em serviços públicos, essencialmente durante as férias, que davam para ganhar uns cobres. Ou então, optava-se por outras ocupações, em bares, cafés ou discotecas. Havia quem fizesse festas de garagem para angariar dinheiro para as férias. Eu, com mais alguns amigos, cheguei a pintar umas casas para ir umas semanas para longe.
Ninguém imagina, principalmente os que não andaram por lá.
Ir para o Algarve era uma aventura de um dia. E longo.
Ir a Vila Real demorava 5 longas horas por estrada sinuosa.
Os piqueniques eram usuais a meio das viagens e nos dia de verão.
A TV era o nosso luxo, a nossa tecnologia. A missa, catequese e a Religião e Moral obrigatórias.
Somos uma geração que trabalha, que tem ordenados iguais há 10 ou mais anos e que abraça o futuro sem sol. As reformas já foram.
Os nossos pais não têm rendimentos para nos sustentar, nem querem. Foram educados no tempo em que, aos 19/20 os filhos iam para a tropa e, quando voltavam, saíam rapidamente de casa em busca de futuro.
Ficamos à rasca com a vida e o futuro nas mãos.
Já nem temos a ilusão. Continuaremos a lutar, como sempre, embora já nem os empregos conseguimos segurar. Os putos que se dizem à rasca, vêm já com mestrados, doutoramentos, erasmus e pós-graduações, e cobram metade dos salários que auferimos.
À rasca andámos todos, mas nós nascemos assim.
Somos uma geração que cedo e sempre aprendeu a desenrascar-se.
Aprendam vocês também. Vão ver que vale a pena. Dá um sabor único à vida!
Sem comentários:
Enviar um comentário
Diga, diga: