Esta ideia surgiu depois de vários acontecimentos que não adianta voltar a trazer à baila, e que desencadearam reacções extemporâneas entre pessoas que se respeitam, ou respeitavam, e que podiam e deviam ter sido evitadas por quem supostamente tutela os campeonatos. Ao contrário da ATRP, há outras entidades com tutela federativa sobre competições semelhantes que se mostraram abertas a participar no dito encontro e que encaram como válidas todas as discussões que possam melhorar o futuro das corridas em Montanha em Portugal. Não percebo como pode a ATRP colocar-se fora disto.
Sou uma espécie de cancioneiro da corrida. Não faço relatos, transmito os sonhos que vivo nas minhas aventuras. Vou fazendo das tripas motivação.
terça-feira, dezembro 29, 2015
Ainda a discutir o trail
Esta ideia surgiu depois de vários acontecimentos que não adianta voltar a trazer à baila, e que desencadearam reacções extemporâneas entre pessoas que se respeitam, ou respeitavam, e que podiam e deviam ter sido evitadas por quem supostamente tutela os campeonatos. Ao contrário da ATRP, há outras entidades com tutela federativa sobre competições semelhantes que se mostraram abertas a participar no dito encontro e que encaram como válidas todas as discussões que possam melhorar o futuro das corridas em Montanha em Portugal. Não percebo como pode a ATRP colocar-se fora disto.
quarta-feira, dezembro 16, 2015
Reflectir o Trail
O trail deixou de ser um convívio entre gente que corre e passou a fazer parte de um quotidiano empresarial, onde o interesse de organizadores e atletas é muito mais que correr livremente e almoçar entre gargalhadas e projectos futuros. E deve assim ser encarado, como um desporto em crescimento, com cada vez mais adeptos e praticantes, e cada vez mais interesses envolvidos.
Contudo, uma das características que traz tanta gente para o trail, é a de não haver distinções entre ricos e pobres, entre filhos e enteados, havendo um total respeito por todos os atletas por igual, sem separação como acontece na estrada - elite separada do "pelotão" - e onde a capacidade de entreajuda, superação, resiliência, destreza e sacrifício, são muitas vezes determinantes para o aparecimento de novos valores. Há no trail casos de sucesso já bem depois dos 50 anos, com vitórias em importantes provas, casos de vitórias de gente que "aparece" neste desporto com historial mediano noutras modalidades e que consegue sucessos por ter características determinantes para um desporto onde a capacidade atlética não basta para vencer. A atracção pelo trail é determinada igualmente pela oferta de percursos na natureza, onde a recompensa de poder correr livremente por espaços inacessíveis é mais que bastante para libertar do reboliço diário citadino que a maioria dos seus praticantes vive.
Como um desporto com bases amadoras, de convívio e de descoberta de novas formas de viver as montanhas e natureza em geral, o trail nasceu um pouco como a história das primeiras provas, com o intuito de reunir pessoas, correr, fazer uns repastos e pouco mais. Os prémios não são normalmente monetários, o reconhecimento é escasso se comparado com outros desportos, não havia até há pouco selecções que participassem em campeonatos do mundo, e o reconhecimento passava por um ou outro apoio de marcas ou lojas de equipamentos da especialidade. Tudo isto mudou em pouco mais de 3 anos.
Depois de em Setembro de 2012 tomarem parte numa reunião, que viria a ser embrionária da ITRA, foi criada em Portugal a ATRP. Esta associação nasceu por vontade e iniciativa de um grupo de amigos apaixonados por trail. Se está a fazer o trabalho para a qual foi criada ou não, é no mínimo discutível. A ATRP enveredou por um caminho de regulação, de organização de calendário e de organização de campeonatos. Na minha opinião nasceu manca, porque sem a devida colaboração dos organizadores. Eu explico porquê: A ITRA nasce pela necessidade de regular competições existentes. Nasce no sentido de preservar o espírito do trail, da não separação entre elite e pelotão, das mesmas condições para todos os participantes, da tentativa de regular as provas, de as uniformizar, de unir esforços entre todos os que participam no desenho, organização e corrida. A ATRP exclui da sua génese e da sua organização as organizações. Há hipótese de as organizações se candidatarem, algumas serão convidadas, mas não há organizadores - pelo menos assim, enquanto organizadores -, no seio da Associação que regula, ou tenta regular, o desporto que aqueles organizavam muito antes de haver ATRP.
O aumento de provas entre 2012 e 2013, após o reconhecimento trazido pelos excelentes resultados internacionais de alguns atletas, trouxe muitas coisas novas e diferentes para o trail nacional. Até 2010 eram poucas as provas no calendário nacional. Quem queria ir a uma prova de 100 km tinha que se aventurar em Ronda ou nos Peregrinos, provas ganhas várias vezes por atletas nacionais. Por cá havia um calendário modesto. A Ultra da Freita só em 2010 passou a ter 70 km. Os Abutres só na segunda edição (2011) passou a ter mais de 42 km. Apenas o MIUT e mais tarde o Oh Meu Deus se atreveram a desenhar e proporcionar provas acima de 100 km em Portugal. Hoje, poucos anos depois, são muitas as provas com 100 ou mais km em Portugal. As provas de trail multiplicam-se e há fins de semana com 3, 4 ou mais provas em diferentes pontos do País. Há, felizmente, muito por onde escolher.
Assim, e sem muito mais explicações ou debates, decidi, com o apoio e incentivo de várias pessoas interessadas pelo futuro deste desporto, organizar com o apoio de algumas entidades, um encontro nacional de organizadores de provas. Será em Miranda do Corvo, no próximo dia 31 de Janeiro. Muitos dos que organizam provas em Portugal são dos mais experientes atletas nacionais. Exclui-los de decisões que os afectam não é justo, normal, nem aconselhável.
O Trail não pode é continuar pouco regulado, sem homologação de provas e/ou percursos, sem fiscalização, sem obrigatoriedade de cumprir requisitos mínimos. Não acabarão más organizações, mas havendo regulação e homologação os atletas poderão escolher em consciência e exigir de quem os deve defender. Não sei quem o deve fazer, nem quero afirmar se deve ser no seio da Federação de Atletismo ou na de Campismo e Montanhismo de Portugal. O que acho é que não pode nem deve continuar assim, com campeonatos distintos e regras diferentes. Urge discutir e alinhar o futuro com a exigência que os atletas merecem.
Poderemos discutir muita coisa por telefone, facebook, jornais, ou mesmo em tertúlias em separado. Mas urge reunir quem se interessa pela efectiva regulação de um desporto que começa a estar demasiado exposto. Não o fazer será colocar em causa tudo aquilo que defendemos e queremos para o trail.
A ATRP foi convidada a participar mas declinou o convite. Acha a direcção actual que não deve participar em tal debate. Respeito. Não concordo, mas respeito.
Em breve divulgarei o programa e temas abordados durante este encontro. O número de participantes vai variar consoante o local onde se realizará, que ainda não está definido.
P.S. - A ATRP será formalmente convidada a participar no encontro. Chama-me a atenção o João Mota, e com razão, que não existiu um convite formal, não sendo por isso legitimo afirmar que a direcção declinou o convite. O convite original foi feito verbalmente a um dos elementos da direcção. Agora segue um formal, por email.
Saudações desportivas a todos.
quinta-feira, novembro 05, 2015
Perdido em Nova Iorque
Fontes e fotos:
http://www.nytimes.com/2015/11/04/nyregion/missing-italian-marathoner-found-on-new-york-subway-still-in-his-running-gear.html
http://nypost.com/2015/11/03/runner-found-after-going-missing-at-finish-line-of-nyc-marathon/
terça-feira, outubro 27, 2015
O homem branco naquela foto
Norman morreu repentinamente, de ataque cardíaco, em 2006, sem o reconhecimento do seu País.
"Ele pagou o preço da sua escolha - explicou Tommie Smith - Não foi apenas um gesto para nos ajudar, foi uma batalha que escolheu travar. Era um branco, um homem branco entre dois homens negros, de pé no momento da vitória, tudo em nome da mesma causa".
"Este Parlamento reconhece a conquista extraordinária de Peter Norman, que ganhou a medalha de prata nos 200 metros nos Jogos Olímpicos da Cidade do México, com um tempo de 20,06, ainda hoje o recorde australiano.
"Eu não entendia por que um homem negro não podia beber água da mesma fonte, apanhar o mesmo autocarro ou frequentar a mesma escola que um homem branco.
Traduzido do original (com autorização do autor) "L'uomo bianco in quella foto" de Riccardo Gazzaniga, publicado aqui.
Twitter - @ricgazza
Facebook - https://www.facebook.com/
quinta-feira, agosto 06, 2015
Zoom às Nike Pegasus 32
segunda-feira, junho 15, 2015
Queres ganhar forma? Corre devagar!
Quem é Maffetone e como funciona o seu método?
Vejamos então como calcular a intensidade recomendada de treino aeróbico, aquela que devemos manter o maior tempo possível para melhorar.
2. Modificar este número segundo uma das seguintes situações:
• Para quem convalesce de uma doença grave /Coração, uma operação, um internamento hospitalar) ou está com uma medicação prolongada, subtrai 10;
• Para quem nunca treinou ou treinou mas ficou lesionado, retoma a corrida após um interregno, ou tem alergias ou está frequentemente medicado, subtrai 5;
• Para quem pratica desporto há dois anos sem problemas mantém o número;
• Para quem tem praticado por mais de dois anos sem qualquer problema e vai progredindo na competição sem problemas, soma 5.
Por exemplo, quem tem 30 anos e cai na segunda situação, acima: 180-30=150 e 150-5= 145. É este o seu ritmo cardíaco aeróbico máximo. Para uma construção de base aeróbica eficiente, deve treinar dentro ou abaixo desse valor durante todo o período de treino.
Há duas exceções a esta fórmula:
-
Para indivíduos maiores de 65 anos é possível que se tenha de somar 10 pulsações, sempre em função do nível de forma e saúde.Isto não significa que tenham de somar 10 de forma automática, é importante que façam uma auto avaliação honesta.
-
Para jovens atletas até 16 anos, esta fórmula não é válida. É melhor que usem uma FCM de 165.
No meu caso, 180 – 42 = 138. A verdade é que, nos treinos mais longos, quando começo num ritmo baixo, entre os 6’/km e os 6’30 (125, 130 BPM), aos 20 km ainda estou naquela euforia que todos temos num determinado momento do treino – “ficava aqui horas, a este ritmo”, ao contrário do que acontece nos treinos mais rápidos, onde o stress da velocidade me faz esgotar energias muito mais rapidamente. O que é certo é que, em prova, a velocidades de menos 1 minuto e meio deste ritmo, entre os 4’45 e os 5’/km, sinto-me bastante confortável. Mas mais importante que a velocidade ou performance, é que continuo a correr, com imenso gosto, sem lesões e sem grandes chatices. É importante mantermos uma “relação saudável” com a corrida, para não nos “enchermos” dela e nos divorciarmos de vez. E principalmente que não desgastemos o corpo desnecessariamente. A minha vida não é só corrida e a vossa também não seguramente.
quinta-feira, março 05, 2015
Numa ultra só és adulto quando te inscreves
(Publicado originalmente no JN Running)
Esta viagem ao interior dos mais de 100km de Sicó é a de Rui Pinho, atleta convidado pelo JN Running. É a viagem de cada um dos que se lança ao desafio. Seja para dez, 20, 40 ou 100km. É a viagem ao interior de cada um de nós. E é muito boa de se ler.
Uma ultra é uma viagem ao interior de nós próprios. É uma viagem rumo ao desconhecido. Sabes por onde viajas, conheces o barco, o mar e até os ventos, mas nunca saberás a infinidade de conjugações com que te irás deparar. É uma viagem deambulante pelo limite do corpo, da mente, da vontade e da resiliência. Todos sabemos ao que vamos, sem saber o que vamos encontrar.
Na azáfama da arena de partida, somos todos gladiadores prontos a serem lançados às feras. O arrepio na espinha, o vazio no estômago, a sensação de levitar sobre todos aqueles que, como tu, sentem a adrenalina a subir no tiquetaque decrescente para o tiro de partida. Nada ouves. O silêncio apodera-se de ti. O ruído que também tu fazes é o de todos os fantasmas que acumulaste e que agora se libertam, rumo aos trilhos para onde vais e onde cumprirão a sua missão: tentar-te, desanimar-te, alertar-te para as tuas fraquezas, para as dores e para os arrependimentos.
Em todo esse ruído há uma paz angelical que te faz sentir capaz de domar todos os teus demónios. É o silêncio do teu treino. O silêncio dos que acreditam em ti, o silêncio das palavras que te disseram há minutos, quando fizeste aquela última chamada – “vou agora ao controlo zero, para a partida. Dorme, eu dou-te novidades”. “Nós acreditamos em ti…” E acreditam. E dormem pouco. E ali vais tu, nessa viagem de mais de 100 km, de mais que muitas horas, que te deixará à mercê dos elementos, da chuva, do chão de barro que te vai fazer lembrar argila nas mãos de crianças que as formam alegremente.
Essa criança, vulnerável, és tu, é o teu filho, é o filho de alguém, desamparado, como tu ali, a cair e levantar, a dar a mão ao colega de ocasião que caiu a teu lado. És tu no teu mundo. Vais de criança a velho. Só és adulto quando te inscreves. És uma criança nas mãos dos voluntários que te abastecem e mimam, és um velho sem forças nas pendentes montanhosas que parecem não ter fim. És marinheiro. És sim. És marinheiro com pele franzida pelo cansaço, olhos de noite em branco perdidos no nevoeiro. Afinal não. És só um pastor que chegou ao alto da sua Serra onde outrora havia moinhos.
Estás a sonhar. Sonhas acordado no meio daqueles pesadelos que os fantasmas te vão lançando. E sonhas com os teus anjos. “Tenho de acabar, só faltam 30 km”. E fazes contas: “30 km, a este ritmo são 7 ou 8 horas, meu Deus, como aguento?”. E vêm os teus anjos. Lembras-te do último telefonema. Voltas a ligar. Não atendem, deixas mensagem, como se deixasses uma âncora que te vai puxar até ao fim; quando o telemóvel volta a tocar já te parece o ruído do motor que puxa a âncora. E animas-te de novo com uma canja, um caldo verde, uma bifana, uma cara conhecida, um popular que te grita “CORAGEM!!!”, e voltas a sentir-te vivo. Meu Deus! Ressuscitei! Sou o maior!… Até à fraqueza seguinte.
É isto. Morres e ressuscitas vezes sem conta, amas e odeias o trail, queres voltar para casa, para os braços dos teus. Mas isto é tudo teu. A viagem é tua. Mesmo que vás ao lado de alguém, que juntes fraquezas com fracos e te mostres forte, ou fraco, perante fortes, não saberás nunca como eles estão, porque eles estão numa viagem só deles, como tu. Na tua. Aproveita. Faz-te forte. Encontra-te. Vais ver-te como nunca te viste. Chorarás como criança ao cruzar a meta. Aquele que correu a teu lado ficará amigo para a vida. Afinal, esteve numa viagem única contigo.
“Foi um belo cenário”
A importância do planeamento numa viagem destas é fundamental. Nesta Ultra de Sicó, planeiam por nós. Nada foi deixado ao acaso. Fartos abastecimentos, alguns de surpresa, apoio dos voluntários – muitos deles também ultramaratonistas e atletas da Associação Mundo da Corrida, e duas “bases de vida”. O termo pode suscitar sustos, mas mais não é que dois pontos onde podemos ter um saco com muda de roupa ou calçado. Importante para quem vai correr muitas horas, já que um coincidia com o início do dia, depois de 7 ou 8h a correr mais de 50 km, e o outro aos 93, onde muitos chegariam com mais de 16h. Estavam portanto no final dos dois primeiros terços de corrida. E os abastecimentos eram excelentes, de 10 em 10 km, alguns com sopa (da pedra, até) ou hidratos à bolonhesa. Havia muito mais o que comer, entre queijo, requeijão, bifanas, batatas fritas, fruta, doces.
Sicó tem muito por onde correr, mas tem também muito para subir. Tem trilhos técnicos, alguns belíssimos, como o da Cascata e o de Vale de Poios – o da Cascata é digno de figurar nos lugares mais idílicos do trail e daria um excelente cartaz da prova. Valeu a pena ter passado por lá. Tal como por Conímbriga, animada por guerreiros que cuspiam fogo na noite, iluminando-a e secando a chuva miudinha que persistiu quase até ao fim das 24h de tempo limite.
Condeixa será seguramente um destino de maratonistas em busca da experiência dos 100 km. Sicó tem todas as condições para dar a Portugal a dimensão de outras provas de 100 km lá fora. A localização, a envolvente paisagística, o envolvimento das forças vivas dos concelhos que acolhem a prova, das suas populações e autoridades, fazem o sucesso desta organização. Estão de parabéns. Pensaram todos os pormenores, focaram-se nos atletas de pelotão (a grande maioria) e superaram as melhores expectativas.
A partida às zero horas de sábado foi uma boa decisão. Com o adiamento das restantes distâncias (65, 25 e 12 km) para a manhã de Domingo, puderam concentrar na prova rainha toda a atenção e apoio, fazendo com que esta seja, até ao momento, a única em Portugal dedicada à distância superior a 100 km, sem misturas, às vezes complicadas de gerir, de ritmos, disposição e diferentes necessidades. A segurança esteve sempre presente, as marcações eram suficientes e havia um responsável da organização em cada PAC. Parabéns ao Mundo da Corrida. Foi um belo cenário para uma viagem ao centro de nós próprios.
As ultras são viagens estranhas. Saímos do conforto, treinamos todo o labirinto de emoções, fraquezas e dificuldades que vamos encontrar. Fazemo-lo em prova para assegurarmos a segurança na loucura. É um salto no desconhecido, mas em bunjee jumping. A fantástica conclusão comum a (quase) todos os que partem é que vale a pena. Mesmo que interrompamos a viagem. Vale sempre a pena descobrirmo-nos. Andámos muitas vezes escondidos de nós próprios. Ali, na montanha, no carrossel de emoções e sensações encontramos facetas que desconhecíamos possuir. Estas guerras aos nossos fantasmas faz-nos sentir vivos como nunca. Sair da nossa zona de conforto é um passo para nos sentirmos ainda mais confortáveis. É um éden de sensações num inferno de emoções.
Fotos Ico Bossa e Pedro Sá