domingo, fevereiro 21, 2010

Poesia

Pergunta-me
se ainda és o meu fogo
se acendes ainda
o minuto de cinza
se despertas a ave magoada
que se queda
na árvore do meu sangue

Pergunta-me
se o vento não traz nada
se o vento tudo arrasta
se na quietude do lago
repousaram a fúria
e o tropel de mil cavalos

Pergunta-me
se te voltei a encontrar
de todas as vezes
que me detive
junto das pontes enevoadas
e se eras tu
quem eu via
na infinita dispersão do meu ser
se eras tu que reunias pedaços
do meu poema reconstruindo
a folha rasgada
na minha mão descrente

Qualquer coisa
pergunta-me
qualquer coisa
uma tolice
um mistério indecifrável
simplesmente
para que eu saiba
que queres ainda saber
para que mesmo sem te responder
saibas o que te quero dizer

Mia Couto

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